domingo, 19 de julho de 2015

Rage Against The Machine

Rage Against The Machine


O sentimento da máquina é o incêndio,
seu deus são cinzas, o fim do fogo!

Ela não vê, pois não tem olhos, é uma ira
sem forma, só peso...se move é por ser
retorcida e muita, sobra de si: pele crispa!

O fogo rola naquele fim que o sopra,
deus das cinzas...divino aquém, porque
humano, semi amorfo, só grita e muito sobra.

Renasce lamentoso e ígneo...de ferro,
negra fundição. Não tendo olhos, ouve.

E se responde é por certidão de pele:
sabe-a em tudo, no ar, chão, no fogo nulo.

Entre as cinzas e o fato, antes do deus,
após o homem: impuro tato!

Toque os fios, a fonte é azul!
Com que visão? Provoca o deus das cinzas.

Pois deseja o fim do jogo, secar a fonte
e acinzelar o jorro!

A máquina tem por fios órgãos-motor,
enreda-os, promíscuos: amor lasso.

Não vê, pois não tem olhos...confiante, tece.
Urde desejos, pulsações de verve,
espasmos de incêndio, desafiando o tecido espaço.

Digo que renasce em tremida pele: um, quatro, vários.
Rage! Tudo tange e rege, desmembrado!

A máquina tem por deus a machina deus.
Fora de si o tempo urge: começa o jogo!

Ex machina, ira muita, mas sem logro.
Maquinismos ondulantes na arena incendiada,
sem olhos, toda cega e espalhada: só corpo.

Machina contra machina...
atiça em toda parte o fogo-povo!


Renan Rodrigues

segunda-feira, 7 de julho de 2014

Vertical (paideia daemonica)


Vertical (paideia daemonica)


Por sobre os estreitos ombros olha o pequeno
Atrás, fixa e longamente
Adiante, reticente

Sente medo, aperta os olhos, lábios fremidos
Ao pai, no coração, indaga
Por que não vejo nada?

Abre os olhos, peito tendido, pernas moles
Olha a frente, se reconhece idoso
Em revés, surge moço

Sente ódio, torce os olhos, dentes crispados
Ao pai, nos punhos, faz-se ouvir
A felicidade é voltar ou ir?

Sente paz, lava os olhos, semblante fresco
A si, no corpo todo, não mais réu
Mira-se, dos pés até o céu

Sorri!


Renan Rodrigues, 07 de julho de 2014

sexta-feira, 4 de julho de 2014

Reencontros (paideia erotica)


Reencontros (paideia erotica)


Tomando assento rente à beira
Um Eros branco acena com um sorriso.
Sorri em mim, no corpo todo, todo brando,
Sinais esquecidos, ressecados num canto.

Sorri, e ouço dizer “leia”. “Ouça”, é o que leio
Neste sorriso enviado numa brisa eriçadeira.

“O Cante que tem por terra sua pátria, mas
Que é dado ao correr de um fluxo livre e solto
Um rio tranquilo que vai, por cima, a tanger
Sonidos cristalinos, nas margens do teu corpo”

Eros fecha os olhos e cessa de sorrir
Sinto tocar-me os pés uma terra, e lavar-me no peito
Águas claras, fibrosas torrentes, superfície-cio,
O toque macio da pele úmida e a nudez morna do rio.

Sorri, e sinto dizer “Sinta”. “Sinto” é o que digo
Neste sorriso, feito meu, embebido na umidade divina.

“Embala-te aí, neste baile, fluir contínuo e sem data,
Pois que de tempo é feito o desejo, e de rio encontros.
Até o esfacelo das areias e o turbilhonar do líquido,
Retesa-te e faz-te homem, no rasteiro dos reencontros"

Renan Rodrigues, 04 de julho de 2014

quarta-feira, 25 de junho de 2014

Verbo


Verbo
                                                            "Só o impossível acontece" - Jacques Derrida

Seríamos,
   com miradas cruzadas
   um tanto promessa, bravia no espírito
   no corpo, arredia.

Éramos,
   nos gestos ladeantes,
   um eros branco, de precipitar
   na pele, um velar, um véu
   todo brando.

Fomos,
   num tempo sem espaço,
   o soletrar de alentos, em linhas
   télicas, fios recolhidos para um
   noturno aninhamento.

Somos,
   num lugar sem hora,
   a travessia de um largo, dobrar-se
   de si em promessa de
   uma eterna demora.

Murmúrio de tempos e casos,
  antes calados que pedido
  sentença ou anúncio,

Conjugação impossível!
  o Sim! que dissemos
  verbo primevo, antes de nós,
                                 apesar de tudo!


Renan Rodrigues, 25 de junho de 2014

terça-feira, 24 de junho de 2014

Carece

Carece

Tudo muito errado
sempre a cogitar enganos
que tolice chamar de carência
nunca carência, isso sim certo!

Penso que sobra, excesso
exagero e transbordamento
porque pedir e não dar?
engordar e empreguiçar
o espírito e a gana
com adiposidade sentimental?

Um corte
fissura
fenda funda
vaziaço de caldo
e areia que corre
de cima abaixo
nessa ampulheta
amarrada ao peito

E que cúmulo!
já por isso...
precisão de agulhas
limas, serras
o cutelo
a empunhadura correta
o fio dos fios
o ultimo
o íntimo

Renan Rodrigues, 14 de junho de 2011

domingo, 22 de junho de 2014

Esparso


Esparso
ao Cid Campeador, desterrado.



A céu aberto, é de mim que sinto falta
E de meu pai, que sou eu na juventude
E de minha mãe, que sou eu na solitude!

A céu aberto, é de brisa que sinto falta
E de nela, meu espalhar pelos cantos
E de seu Cante soprado no andar, Luz

                         que desterra melodias - a céu aberto!

Da solitude e da juventude de meu pai
e de minha mãe, evocantes, antes de tudo
serem apenas um, em mim!

Em mim que nunca fui, um que só
mas o muito que as brisas levam
neste corpo inteiro ou quase

                        miríades de olhos cerrados!
                     
Semente alada no pó de um chão
nunca encontrado e que faz casa, num
azul límpido deste céu sempre aberto,

                                                  esparso!


Renan Rodrigues, 22 de junho de 2014


sábado, 14 de junho de 2014

Infância


Sabendo serem as últimas palavras dirigidas ao pai impassível,
A criança, ainda sem fenda nem ponta, lança-lhe:
                                                                           O que é o Amor?

Este sai e retorna, depositando-lhe nas mãos tranquilas
Um afiado gume...

Como um espelho, a infância retida nesse ínterim-aço
Termina e prolonga-se em reflexo...

Parte então o pai, desta vez para sempre!

Renan Rodrigues, 14 de junho de 2014